Qual é a importância de preservar o intestino durante a cirurgia de endometriose infiltrativa? A resposta para essa pergunta parece simples, mas não é. Para uma pessoa com endometriose profunda com acometimento do intestino, é lógico pensar que quanto menos extensa for a retirada do intestino, mais simples será a cirurgia – e não é bem assim.
Para explicar melhor essa questão, devemos entender sobre os tipos mais comuns de cirurgia realizada nos casos de endometriose com acometimento intestinal.
Cirurgias de endometriose infiltrativa
Quando vamos remover os focos de endometriose aderidos à parede do intestino, as técnicas mais comumente utilizadas são:
Shaving
Disco
Ressecção segmentar
Para saber mais detalhes sobre essas técnicas, clique aqui para ler um texto sobre cirurgias para endometriose intestinal e, aqui, para saber mais sobre cirurgia robótica para endometriose.
Shaving
De maneira simples, o Shaving é o mesmo que remover as camadas mais externas do intestino sem danificar as suas camadas estruturais mais importantes. É uma remoção mais superficial, ou como alguns colegas gostam de chamar, uma “depilação” para retirar a lesão.
Disco
Já o disco é quando removemos parte da parede do intestino sem seccioná-lo completamente, isto é, seria a retirada de todas as camadas em espessura, mas não há solução da continuidade do órgão. A reconstrução pode ser feita com grampeadores especiais ou com pontos.
Ressecção segmentar
No caso da ressecção segmentar, uma porção completa de intestino é removida, sendo o procedimento reservado para doenças com acometimento mais extenso e profundo do órgão. A emenda também pode ser realizada com uso de grampeadores ou pontos cirúrgicos.
Mas qual cirurgia deve ser escolhida?
Durante os anos de evolução médica, o estudo da anatomia cirúrgica nos permitiu entender os planos operatórios que tornaram a remoção de segmentos intestinais, fácil, quase sem perda de sangue.
Quando decidimos preservar o intestino, muitas vezes temos que direcionar a abordagem do cólon e reto para fora dessas zonas de “conforto” o que torna o processo mais trabalhoso e às vezes até mais demorado.
Mesmo quando optamos pela ressecção segmentar, o cirurgião que trata endometriose infiltrativa tende a remover o mínimo de parede intestinal possível.
É interessante que, às vezes, a cirurgia pode durar mais de quatro horas, e a peça cirúrgica (o material que é retirado) é tão pequena que os auditores de algumas operadoras de saúde questionam se a cirurgia foi realmente feita.
O que eles não sabem: muito trabalho é empregado para a cirurgia ser cada vez menos invasiva.
Por que não retirar um pedaço do intestino?
Bom, agora vamos entender por que o cirurgião busca preservar o intestino na cirurgia de endometriose infiltrativa.
Endometriose não é câncer
A regra básica de tratar uma doença é não ser mais agressivo do que ela própria. O tratamento da endometriose intestinal não exige uma remoção do problema associado a uma margem grande de segurança, nem é necessário a remoção da vascularização e drenagem linfática próxima a esse local. Por outro lado, esses passos são fundamentais nos casos dos tumores malignos.
Preservar a inervação e vascularização é importante
Quando não é necessária a retirada de grandes extensões de intestino, primeiro o risco de complicações diminui, pois quanto maior a área necessária para cicatrização, maior a chance de vazamento da emenda.
Em segundo l, há menos dano a vascularização e inervação o que minimiza alterações no funcionamento intestinal pós-operatório.
Não pode ficar doença para trás
Quando os focos de endometriose profunda não respondem ao tratamento clínico, as lesões visíveis devem ser removidas e, para tanto, devemos abordar cirurgicamente todas as lesões. Em outras palavras, ressecções incompletas diminuem os benefícios da cirurgia e do ganho de fertilidade relacionado a ela.
Qualidade de vida é tudo
É importante saber que mesmo que pensemos sempre em ser conservadores do intestino, nem sempre isso é possível e algumas pacientes terão que ser submetidas a ressecções segmentares. Isso não quer dizer que elas terão evolução pior do que as outras.
Recentemente, uma colega de equipe, mentora e grande amiga, Dra. Luciana Pyramo, estudou a qualidade de vida das pacientes submetidas a cirurgia de endometriose com abordagem de intestino em sua tese de doutorado.
Sua conclusão foi de que, independentemente da técnica empregada, apesar de todas as consequências associadas à operação, TODAS as paciente experimentaram melhora da qualidade de vida e diminuição da dor que as fazia sofrer.
Conclusão
Não devemos adaptar a doença ao procedimento que queremos fazer, mas, sim, escolher a melhor cirurgia de endometriose infiltrativa que trate bem o problema.
Ótima semana para todas!
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